Em meio ao caos que se instaura nos finais de ano, onde pessoas se debatem com presentes, ceias, reuniões e encontros forjados na manutenção de uma capa de conveniência, me pego pensando na importância do momento presente.
Pessoas esperançosas com o ano que virá, outras ainda sofrendo pelo que passou, apegam-se à memórias que não conseguem desconstruir ou a objetos que carregam uma carga emocional desafiadora, nos mantendo presos eternamente em um momento temporal específico- muitas vezes dolorido e que nos gera sofrimento (e incrivelmente a estes nos apegamos ainda mais).
Vejo muitos desejando que sua vida mude automaticamente com a entrada de um novo ano, desejando acreditar na já gasta promessa de uma nova energia. “Recomecemos do zero!” E imediatamente tudo se ajusta, a vida se reseta integralmente, sumindo com todos os problemas e dificuldades, como em um passe de mágica, sem exigir de nós o mínimo esforço.
Observo tudo em câmera lenta: o pânico com uma ceia de Natal, de Réveillon, o local, as taças, os horários, os presentes, a roupa, o externo, a perfeição inatingível. O mais importante permanece esquecido- o encontro com nós mesmos, com nossa alma, nosso eu mais profundo, com o Cristo que nos habita, com o agora. Os momentos vivenciados com aqueles que nos são caros e preciosos. A vida. O ar que entra para os pulmões, cheios e plenos com a integralidade de vida que absorvemos em uma simples respiração.
Momentos de contemplação e pura gratidão são cada vez mais raros, pois o mundo é feito para nos subtrair de nós mesmos. Da nossa vida, desse olhar amoroso e compassivo em relação à nós e ao pequeno universo que nos cerca. Estamos sempre preocupados com algo, no passado ou no futuro. “Pré-ocupamo”-nos com afazeres secundários. Pessoas secundárias, relações secundárias, sentimentos secundários, necessidades secundárias e personagens criados para uma vida que já em muito não nos pertence.
O momento presente é a única coisa que temos. O passado dissolveu-se no éter, e o futuro ainda não foi escolhido. Somente o presente nos pertence. E nele reside toda nossa força, nele está a chance que buscamos de realmente mudar algo. Nele está o sopro da vida que nos eleva e modifica. A chave para uma nova energia. Em nenhum outro lugar.
Um dos marcadores mais tangíveis do quanto realmente estamos “despertos” e supostamente evoluídos é o quanto de presença no momento presente conseguimos sustentar em nosso dia-a-dia. O quanto de paz carregamos em nosso coração, mediante toda e qualquer circunstância. Nada nos traz maior certeza do caminho a seguir do que um estado profundo de paz e presença. Nele enxergamos a tão desejada confirmação de nossa alma, em nenhum outro sinal ou alerta externo.
A presença é a manifestação real de nossa consciência, é uma autorização de nossa mente consciente- que governa, analisa e executa comandos, para que nossa alma verdadeira seja traduzida em comportamentos. A presença indica um comprometimento com nosso Deus interno, o Cristo falando através de nossas palavras e ações. Indica que estamos profundamente conectados à quem realmente somos, seja nesta ou nas infinitas dimensões em que habitamos de forma simultânea.
Um estado interno de presença, uma real intenção de estar aqui e agora estrutura nossas células e moléculas de todos os corpos nos moldes da Divindade. É uma das maneiras mais profundas de amor-próprio, auto-respeito e integridade de alma. Gera uma estrutura energética inabalável, uma fortaleza interna inquebrantável, que é percebida na sutil gentileza e na bondade de nossos atos, elevando tudo e todos a nosso redor. Isso é a consciência Crística, o Norte energético que nos direciona.
Que possamos valorizar a riqueza de realmente respirar a plenos pulmões, de diminuir o ritmo de forma consistente, de voltar a enxergar beleza nas sutilezas da vida. De nos permitirmos simplesmente descansar para voltar melhor. Que nossos olhos consigam voltar a enxergar os pequenos milagres que nos rodeiam a cada segundo. Que eles se permitam acompanhar o vôo de um pássaro no céu, o desabrochar e o colorido das flores, a delicadeza das pétalas, dedicando a eles o sorriso interno dos que entendem o quão raro isso é. Esta é a maior riqueza da nossa alma: nutrir-se da beleza de Deus a cada instante, e regozijar-se nela, transcendendo sua própria essência. Nisso reside a grandeza de estarmos vivos. Saibamos apreciar os momentos presentes. Brindar à vida, entender a magnitude do que realmente é viver no agora. Deixar ir o que não mais nos pertence (sejam pessoas, coisas ou momentos). Saibamos voltar a viver de verdade no momento presente!





